A medicina ayurvédica tem uma visão diferente sobre os desequilíbrios mentais e inclui práticas integrativas que vão além de medicamentos e procedimentos convencionais praticados pela medicina moderna.
Por Matheus Macêdo, fundador do Vida Veda
Muita gente repete a máxima de que a Ayurveda não trata doenças, mas o ser humano. Porém, essa afirmação pode gerar confusão sobre os tratamentos ayurvédicos. Uma pessoa pode dizer, mas eu sou um ser humano e tenho esquizofrenia.
A Ayurveda pode me ajudar?
A resposta é: Sim. A Ayurveda tem uma linha de tratamento para todas as doenças, porque os Samhitas, por mais que sejam textos muito antigos, com cerca de 4 mil ou 5 mil anos, já faziam listas e listas de doenças e mesmo para as doenças que não foram listadas claramente, é possível encontrar um parâmetro pelo qual podemos entender aquele desequilíbrio e tratá-lo.
Quando falamos em transtornos mentais incluímos doenças desde autismo, demência, ansiedade, depressão, entre outras. Na medicina moderna esses desequilíbrios são tratados por especialidades como a psiquiatria, psicologia e algumas vezes a neurologia.
Para a Ayurveda a concepção de anatomia corporal e fisiológica é completamente diferente à da ciência moderna e quando falamos sobre doenças em qualquer tratamento ayurvédico devemos estar atentos a isso.
Um exemplo é a dor de cabeça. Não conseguiremos, sob o espectro ayurvédico, descrevê-la e tratá-la sem levar em consideração os doshas, ou a fisiologia ayurvédica, porque por mais que os sintomas possam ser semelhantes, as causas podem ser completamente diferentes e o tratamento será consequentemente diferente. É preciso investigar quem está por trás da dor de cabeça. Quais hábitos tem? O que desencadeia a dor?
Justamente por compreender o ser dentro de sua complexidade, os textos milenares trazem considerações sobre os desequilíbrios que hoje podemos classificar como doenças mentais, psicológicas e psiquiátricas.
Em um livro muito famoso, o Ashtanga Hrdayam, estão descritas as oito divisões, que são os ramos ayurvédicos. Entre esses ramos, tem um que se chama Bhut Vidya ou Graha Chikitsa e normalmente é nesse espaço que aparecem enfermidades que ocorrem como desdobramento de uma disfunção que é psiquiátrica ou psicológica.
Existem também algumas enfermidades que não entram exatamente dentro desse ramo. Por exemplo, temos doenças como “Unmāda” e “Apasmāra” que são dois tipos de enfermidades patológicas que ficam dentro de “Kāy Cikitsā”.
Essa divisão entre ramos não é muito rígida, por isso, muitas vezes uma doença pode fazer parte dois ou três ramos ao mesmo tempo. O que demonstra que apesar de termos todo um ramo que se dedica aos estudos do que conhecemos como distúrbios psiquiátricos e psicológicos, existem outros textos que também vão abordar essas questões.
Qual seria, então, o tratamento?
Podem ser prescritos tratamentos com terapias corporais, medicamentosas, mas também abordagens que envolvam a família, grupos de aconselhamento e até a espiritualidade. E todas são possibilidades de tratamento de doenças mentais para a Ayurveda.

Essas abordagens são diferentes dos tratamentos convencionais que estamos acostumados a entender como conhecimento científico. Podemos dizer, tentando nos aproximar da concepção moderna, que muitas vezes, algumas doenças psiquiátricas precisam receber um tratamento considerado metafísico, ao invés de físico, com medicamentos e procedimentos.
É claro que alguns médicos modernos prescrevem terapias não farmacológicas e até espirituais, mas a diferença é que esse tipo de terapia não é complementar, mas são basilares para a Ayurveda.
A religião, por exemplo, é uma parte muito importante desse tipo de tratamento. Nessa medicina milenar, é possível considerarmos a eficácia de um tratamento litúrgico, por exemplo. Na Índia, podemos recomendar que uma pessoa vá a um templo, faça uma oferenda para determinada entidade, ou determinado ser.
Se quisermos adaptar para nosso contexto judaico-cristão seria o equivalente sugerir ao paciente ir à igreja rezar um terço, ou então, que procurasse um terreiro de umbanda, um centro espírita, ou uma sociedade taoista, ou seja, qualquer ambiente que lhe fornecesse essa experiência.
A perspectiva ayurvédica aceita as práticas espirituais como um elemento possível no tratamento. Se a pessoa está doente e a enfermidade dela é psicológica ou psiquiátrica, o tratamento para algumas dessas enfermidades, além de focar no bem-estar físico, vai englobar esses processos que são vistos na nossa cultura como não científicos ou não medicinais, como por exemplo, a forma que a pessoa se relaciona com o mundo, crenças e hábitos.
Então, se você se deparar com essa pergunta novamente “Ayurveda trata de problemas mentais?”, talvez seja interessante saber que sim e que o caminho a ser percorrido pode ser um que você não esperava.