Como Dhairya, uma das principais terapias mentais do Ayurveda, nos ensina a viver com mais perseverança
Por Alice Azara, da Equipe de Escrita do Vida Veda
Quantas vezes, por saber que algum dos nossos hábitos nos adoece a cada dia, começamos um processo de mudança e desistimos no meio do caminho? Mesmo com cenas chocantes dos efeitos do cigarro para a saúde, a quantidade de fumantes é surpreendente. Embora sabendo dos malefícios do consumo excessivo de gordura e açúcar, não pensamos duas vezes antes de comer uma fatia de bolo atrás da outra. Apesar de saber que aquele alimento nos fará passar mal por dias, insistimos em comer de novo e de novo.
Muitas vezes temos a ideia equivocada de que apenas estar ciente dos fatos nos dará motivação suficiente para mudar, mas isso não parece se refletir na vida real… E o Ayurveda nos dá a chave do que está faltando: Dhairya, uma das três principais terapias da mente.
Se você é uma seguidora assídua do Vida Veda, já ouviu falar destas terapias diversas vezes ainda que de forma indireta. De acordo com o vaidya Matheus Macêdo, esses são conceitos frequentemente abordados no Projeto 0800.
“Muitas vezes o que eu estou falando no 0800 que as pessoas acham que é senso comum, na verdade são essas três terapias da mente indicadas pelo Ashtanga Hrdayam Sutra. Quando a pessoa diz que, por exemplo, ela sabe que o que está fazendo faz mal para ela, mas não consegue fazer diferente, ela está me dizendo que precisa de um pouco de dhi, dhairya e atma dvighiana, as três terapias dos doshas da mente.”
No último texto falamos sobre a primeira das terapias, Dhi ou “discernimento”, e sua importância no processo de compreendermos a realidade e os problemas que surgem em nossas vidas, sabendo discernir o impacto real que têm no nosso dia a dia. Mas só implementar essa terapia na rotina não é o bastante para garantir uma saúde mental equilibrada. Ainda de acordo com Matheus, as três terapias são fundamentais na vida diária.

Um exemplo disto é a questão que citamos lá no início: a pessoa tem discernimento para saber que aquela decisão que está tomando não lhe faz bem mas, ainda assim, continua agindo da mesma forma, faltando a coerência de agir como sabe que deveria. E coerência é apenas uma das diversas traduções possíveis para Dhairya, sendo possível também traduzir como “firmeza”, “perseverança”, “obstinação”, “consistência” e até mesmo “coragem”.
Entretanto, é essencial atentarmos para um aspecto importante desta última tradução possível: quando falamos em “coragem” não queremos inferir como sendo o contrário de medo ou covardia… É, de acordo com Matheus, a coragem de ser coerente.
“Muitas pessoas que sofrem de doenças mentais, segundo o Ayurveda, têm essa dificuldade de lidar com a realidade. Então, não é só uma questão de autoconhecimento, não é só você saber o que é melhor para você… É você ter a firmeza de fazer o que você acha que é melhor para você, o que você sabe que é melhor para você.”, afirma o vaidya.
Desta forma, dentro de um processo de tratamento de doenças mentais pelo Ayurveda, assim como dhi, a terapia de dhairya ocorre principalmente por meio de trocas e conselhos entre o vaidya e o paciente. “Às vezes as pessoas acham que doença é uma coisa que tem um diagnóstico que você vai ver na pele, que você vai ver no estômago… Mas se você vai ver as doenças mentais, elas falam muito de um lugar de autoconhecimento, coerência com o que você conhece, discernimento para entender o que que faz bem e o que não faz bem…”, explica Matheus. “E dhairya é muito central nesse processo! Não adianta nada você entender o que é bom e ruim e continuar fazendo o que é ruim.”
Mas a mudança nunca é um processo fácil e muitas vezes nem sabemos de onde tirar a perseverança que precisamos para continuarmos firmes nos nossos propósitos. Essa dificuldade é normal e até mesmo explicada por processos neurológicos do nosso cérebro!
No texto anterior explicamos por que é tão difícil mudar hábitos e quais mecanismos podemos utilizar para tornar a mudança mais simples no nosso dia a dia. A verdade é que todo processo de transformação demanda muito de nós e, para isso, precisamos acima de tudo respeitar nossos ritmos e aceitar que a trajetória pode ser sinuosa mesmo que constante.
“Não é um remédio que você toma e depois para. Dhairya é uma consciência que se você não tem, precisa adquirir.”, conclui Matheus. Mais do que uma terapia temporária, dhairya é um conceito que deve permear toda a nossa vida para que, principalmente em tempos em que as adversidades nos atingem, tenhamos a perspectiva e a perseverança de continuar trilhando o caminho que sabemos, através de dhi, que será melhor para nós.